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Cena de Le HavreCena de Le Havre

Kaurismaki discute imigração

(Locarno, brpress) - Com filme Le Havre, exibido em praça pública em festival suíço, cineasta finlandês trata da questão dos imigrantes na Europa – um de três produções sobre o tema. Por Rui Martins.

(Locarno, brpress) – O cineasta finlandês Aki Kaurismaki, cujos filmes são endeusados pela crítica e pelos apreciadores do cinema, decidiu tomar uma posição e se engajar na questão dos imigrantes na Europa. Seu filme, Le Havre , é um dos três filmes tratando diretamente dos imigrantes. Os outros dois são Vôo Especial, onde se denuncia a política da Suíça, e o outro é o filme canadense Bachir Lazhar, sobre um professor argelino requerente de refúgio.

O filme de Kaurismaki foi mostrado no Festival de Cannes, onde muitos críticos esperavam sua escolha para um dos prêmios. Ele próprio, já bastante conhecido por mostrar facetas diversas da miséria humana, explica por que escolheu esse tema: “O cinema europeu não trata muito da agravação contínua das crises econômica, política e, sobretudo, moral, causadas pela questão não resolvida dos refugiados”, diz. “A sorte reservada aos extracomunitários que tentam entrar na União Européia é variável e, com frequência, indigna”.

Para Kaurismaki, a fraternidade mostrada no filme entre os habitantes de um bairro da cidade portuária francesa Le Havre é alguma coisa importante. “Se não houver mais fraternidade, a sociedade humana se tornará uma sociedade de formigas”, como dizia o também cineasta Ingmar Bergman.

Esperança

O filme Le Havre tem um lado otimista e de esperança – o que constitui uma supresa na filmografia pessimista de Kaurismaki. Ele diz preferir, nos contos de fadas, sempre a boa versão: assim, no Chapeuzinho Vermelho prefere a versão em que come o lobo, mas, na vida real, prefere os lobos aos homens pálidos de Wall Street.

Os filmes de Kaurismaki têm um colorido diferente, menos forte, e seus cenários escolhidos são ainda de um tempo passado, o que garante um charme em suas imagens da época dos anos 50. Mesmo porque, como ele próprio confessa, a arquitetura moderna lhe faz “mal aos olhos”.

Marx

Kaurismaki criou o personagem Marcel Marx, cujo nome tem alguma simbologia, para mostrar uma reação fraterna da parte de alguém que, mesmo sem recursos, acolhe um refugiado e o esconde da polícia. Ex-escritor, para ganhar alguns trocados Marcel é engraxate e tem uma vida pacata, que se divide entre seu trabalho, o bistrô onde encontra amigos e toma seu aperitivo e sua esposa Arlety.

A calma dessa vida regrada de Marcel Marx é quebrada com a fuga de um menino africano escondido num container, interceptado pela polícia de imigração, dentro do qual sua família e outros africanos esperavam chegar à Inglaterra. Embora com a esposa no hospital, Marcel dá acolhida ao menino e conta com o apoio de outras pessoas do bairro para driblar as autoridades.

(Rui Martins/Especial para brpress)

BOX 1 – TRATAMENTO SUÍÇO AOS DEPORTADOS

(Locarno, brpress) – Durante o vôo, que pode durar mais de dez horas, imigrante expulso não pode ir ao banheiro, nem ficar de pé.

(Locarno, brpress) – A Suíça é o único país da Europa que, para expulsar imigrantes de avião, usa o método do entrave, ou seja, eles ficam com os pés e as mãos algemados e uma corrente impede que possam ficar de pé. Durante o vôo, que pode durar mais de dez horas, o imigrante expulso não pode ir ao banheiro. Três imigrantes já morreram durante esses vôos e tinham sido presos sem qualquer delito cometido.

O método suíço é bárbaro, indigno e vergonhoso e foi regulamentado durante a presença, na junta de sete ministros que governa o país, do ministro do Partido do Povo, Christoph Blocher, líder da extrema-direita, chamada de populista, mas com comportamentos de partido neo-nazista.

Ódio e delação

Esse partido, com quase 30% de votos nas eleições legislativas e primeiro partido suíço, costuma promover campanhas contra imigrantes, propor votações populares com o objetivo de transformar os estrangeiros no bode expiatório de todos os males suíços, política semelhante à usada por Hitler contra os judeus.

Uma nova lei do Ministério da Justiça no Departamento de Emigração inclui a obrigação dos diretores de escolas denunciarem as crianças de imigrantes sem papéis. Essa proposta adicional ao arsenal de medidas deixadas pelo ex-ministro do Partido do Povo, deve-se à nova ministra, que é do Partido Socialista.

Lei semelhante não existe nos outros países europeus, mas tinha sido criada, em 1935, na Alemanha nazista, e consistia na obrigação dos professores denunciarem os alunos judeus, ciganos ou filhos de comunistas.

Vôo Especial

Essas revelações foram feitas no decurso do encontro da imprensa com o cineasta Fernand Melgar, depois da exibição do seu filme Vôo Especial – exatamente sobre o método de deportação suíço –, concorrendo ao Leopardo de Ouro no Festival de Cinema de Locarno.

O novo filme de Fernand Melgar foi autorizado a documentar o lugar onde ficam presos os “sem papéis”, alguns deles já tendo família na Suíça, onde vivem há até 20 anos. É o caso de um kosovar em processo de expulsão, que saiu do Kosovo na época da Guerra dos Bálcãs e, sem mais quase nenhuma ligação com seu país de origem, acabou se integrando na Suíça.

Mais filmes

Melgar já fez outro filme, há poucos anos, Forteresse, sobre os campos de refugiados, onde ficam presos os estrangeiros enquanto aguardam os julgamentos de seus pedidos de refúgio. E fará um terceiro filme sobre os imigrantes, mostrando como vivem no país de origem os imigrantes expulsos.

Na prisão onde ocorreram as filmagens, localizada no lado suíço-francês, conta Melgar, o tratamento por parte dos responsáveis é correto, mas do lado suíço-alemão os imigrantes chegam a ficar em células isoladas, sem terem cometido qualquer crime ou delito – razão pela qual ocorrem suicídios.

Suíço, o cineasta deixa claro haver uma responsabilidade coletiva do povo de seu país nessas medidas desumanas e discricionárias, pois foi esse mesmo povo que votou e autorizou essas ações contra os imigrantes. (R.M)

BOX 2 – CURTA MOSTRA CABOVERDEANOS EM PORTUGAL

(Locarno, brpress) – Nuvem ou Peixe-Lua, produzido pela Suíça, foi apresentado na Quinzena de Realizadores de Cannes antes de ser apresentado no Festival de Locarno.

(Locarno, brpress) – Filho de emigrantes portugueses em Lausanne, Basil da Cunha vive atualmente em Portugal, onde tem feito filmes curtas-metragens, e o mais recente, Nuvem ou Peixe-Lua, produzido pela Suíça, foi apresentado na Quinzena de Realizadores de Cannes antes de ser apresentado no Festival de Locarno, em duas projeções especiais diante de um grande público.

O filme tem a particularidade de ser falado no dialeto caboverdiano e ter sido filmado num bairro de Lisboa, com moradores locais. Conta a história de um jovem pouco inclinado ao trabalho, um tanto sonhador, que parte em busca de um peixe-lua, única maneira, de acordo com um vidente da região, de conseguir conquistar o amor da servente do bar, que ama, mas que o expulsou por não ter com o que pagar.

Segunda geração

Trata-se de uma segunda geração de caboverdianos que chegou a Lisboa, depois da Revolução dos Cravos e da independência, e que vive na periferia da capital portuguesa.

“Procuro mostrar um cinema que se mistura com a vida. Não cheguei lá, nessa periferia, para fazer um filme, não, eu vivo lá com eles. E não cheguei com recursos e nem com equipe técnica. Ao fim, cerca de 40 pessoas do bairro participam do filme, desde velhos até jovens – essas pessoas fazem parte do filme de maneira voluntária”, conta o cineasta.

Coletivo

“Levamos três meses para fazer o filme porque tivemos de redefinir diversas vezes com eles o roteiro”, continua Basil da Cunha . “É uma produção que se cria de maneira coletiva, tanto na filmagem como na montagem, e não depende de um roteiro pré-estabelecido, que tenta dominar a realidade.”

Basil da Cunha já fez outros curtas-metragens, tem uma pequena produtora em Lisboa e conta o apoio de produtores suíços. Espera logo poder filmar um longa-metragem, para o qual tem um projeto definido mas ainda não pode comentar. (R.M.)

BOX 3 – IMIGRANTES BRASILEIROS NO JAPÃO

(Locarno, brpress) – Saudade foi filmado na pequena cidade de Kofu, onde Takeshi, personagem do filme, só encontra emprego nos canteiros de obras e conhece gente de diversos países.

(Locarno, brpress) – O título é bem sugestivo: Saudade. E no filme podem-se ouvir palavras em português do Brasil, porque o cineasta Katsuya Tomita incluiu no seu roteiro a participação de imigrantes brasileiros, logo depois da recente crise mundial geradora de desemprego. A maioria dos brasileiros nikkeis mostrados no filme já retornaram ao Brasil.

O lugar das filmagens foi a pequena cidade de Kofu, onde Takeshi, personagem do filme, só encontra emprego nos canteiros de obras e conhece imigrantes de diversos países – o que acaba por desenvolver nele uma rejeição dos imigrantes, mesmo que sejam descendentes de japoneses emigrados, no passado, ao Brasil.

Vítimas da recessão deflagrada mundialmente pela crise dos subprimes e especulações nos EUA, os imigrantes brasileiros preparam suas malas para retornar ao Brasil, depois da frustrada tentativa de fazerem o caminho inverso ao de seus bisavós.

Só em portugês

Katsuya Tomita enfoca a grande comunidade brasileira que, vivendo fechada num enorme gueto, pode sobreviver mesmo sem saber falar o japonês. E confirma o absurdo das escolas privadas brasileiras. Nelas, os filhos dos imigrantes brasileiros não aprendem o japonês e são, assim, duplamente marginalizados, por não poderem se integrar.

O não domínio da língua japonesa acaba por reforçar a discriminação de que os imigrantes brasileiros são alvo por parte da fechada sociedade japonesa. Saudade, um dos últimos filmes exibidos no Festival de Cinema de Locarno, foi bem acolhido e participa da competição internacional. (R.M.)

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