Shakespeare pós-moderno
(Berlim, brpress) - Coriolanus, apesar de usar armas de guerra atuais, guarda a linguagem shakespeariana – e esse é o seu principal sabor. Por Rui Martins.
(Berlim, brpress) – Raph Fiennes deixa Lord Voldemort em paz até que o último Harry Potter seja lançado este ano para mergulhar no universo de Shakespeare. Ele é o diretor e o principal ator do filme inglês Coriolanus, cujo mote é transportar a guerra entre Roma e os Volcos para os nossos dias, com tanques de guerra, bazucas, metralhadoras da última geração e gente morrendo e correndo nas ruas.
Não por acaso, foi a Sérvia que cedeu os locais para os confrontos entre o herói romano Caius Martius, o Coriolanus do título (Fiennes), mostrado como um sanguinário guerreiro, e seu adversário Tullus Aufidius (Gerard Butler, o Rei Leônidas de 300). Os atores, acompanhados por Vanessa Redgrave (Volumnia), concederam uma entrevista coletiva no Festival de Berlim, onde o filme foi exibido.
Coriolanus, apesar de usar armas de guerra atuais, guarda a linguagem shakespeariana – e esse é o seu principal sabor. Linguagem ainda mais marcante, quando pronunciada pela imponente atriz inglesa Vanessa Redgrave, no papel de mãe guerreira de Caius Martius, cujo nome passa a ser também Coriolanus, em homenagem à sua vitória sobre os Volcos, na batalha decisiva de Corioles.
A vitória de Martius Coriolanus lhe deu enorme popularidade e sua ambiciosa mãe, Volumnia, assim como políticos amigos, quer ver o herói militar transformado em homem de Estado. Mas, para isso, Coriolanus precisa ser eleito, e o guerreiro acostumado a responder taco a taco os golpes de seus inimigos, militar sem outra formação, não sabe fazer discursos políticos para conquistar eleitores. Mesmo porque tem, como é comum nas classes dominantes, um profundo desprezo pelo povo.
Revolta popular
Por isso, provocado por alguns membros da oposição e populares revoltados, já que Roma vivia penúria e fome decorrentes da guerra, assina sua derrota ao perder o controle e injuriar os plebeus. Tudo é transmitido pela televisão.
De herói, Coriolanus se tranforma, num piscar de olhos, na mais detestada de todas as personalidades romanas e sofre a punição suprema da época – comparável à cassação dos direitos políticos seguida do ostracismo ou banimento de Roma.
Orgulhoso, ferido na sua vaidade de guerreiro vencedor, revoltado com a ingratidão popular, Coriolanus decide se vingar, unindo-se ao seu inimigo Tullus Aufidius – pelo qual parece ter uma atração mesmo física –, para juntos destruírem Roma. Em outras palavras, de herói vira traidor.
“À altura”
Antes de ser filme, a peça de Shakespeare foi encenada no teatro, em Londres, dela fazendo parte a atriz Vanessa Redgrave e o ator Gerard Butler, nos papéis que interpretam no cinema. Encantado com o domínio de cena da veterana atriz, de 74 anos, o ator escocês diz que não resistiu e pergutou à filha de Redgrave de onde ela tirava tanta energia. A resposta foi: “Mamãe simplesmente faz”.
Butler, relacionado a comédias românticas e heróis musculosos (ele voltou à forma pós-300 em Coriolanus), teve de devolver a ironia da imprensa ao responder como se sentia ao fazer um longa com recorte mais intectual: “É bom se arriscar. Eu assumo esses desafios para saber se consigo estar à altura de projetos mais intelectualizados”. A julgar pela avaliação positiva de Coriolanus pela crítica, certamente está.
(Rui Martins/Especial para brpress, com informações da redação brpress)