Sós contra o nazismo
(Berlim, brpress) - Luta solitária e sem meios de um casal de trabalhadores contra Hitler é o tema do filme Sós em Berlim, destaque na Berlinale. Por Rui Martins.
(Berlim, brpress) – A luta solitária e sem meios de um casal de trabalhadores contra Hitler é o tema do filme Sós em Berlim (Alone in Berlin, 2016), um dos destaques na competição do 66o. Festival Internacional de Cinema de Berlim, que começa em fevereiro. Dirigido pelo suíço-francês Vincent Perez, o filme, ainda pós-produção, com Emma Thompson, Brendan Gleeson, Daniel Brühl e Mikael Persbrandt nos papéis principais.
Talvez o nazismo não tivesse se desenvolvido na Alemanha a ponto de provocar uma guerra mundial se naquela época existisse a internet e as redes sociais, com a incontrolável possibilidade de contestação e polêmica. Naqueles anos de controle total da sociedade pelo Estado nazista, não havia espaço para divergências. Mas, mesmo assim, alguns ingênuos solitários tentaram fazer frente aos desvarios de Hitler e à opressão da máquina nazista, utilizando os precários meios de que dispunham.
Foi o caso de um jovem suíço Maurice Bavaud: sem qualquer apoio e agindo individualmente tentou assassinar Hitler, mas esse gesto improvisado foi punido com seu fuzilamento. Outro jovem, esse alemão, Georg Elser, teve também sua tentativa frustrada e acabou fuzilado quase no fim da guerra.
Entretanto, a tentativa mais precária e visionária de luta contra o nazismo foi a do casal Otto e Elise Hampel (vividos por Gleeson e Thompson).
Doméstica e carteiro
Tanto que as ações pacifistas e mesmo singelas desse casal são consideradas heróicas a ponto de terem inspirado um romancista alemão, um seriado na televisão alemã, uma peça de teatro e agora um filme selecionado para a competição no Festival Internacional de Cinema de Berlim.
Logo após o término da II Guerra Mundial, o conhecido escritor alemão Hans Fallada teve acesso a uma parte dos arquivos da Gestapo e lá encontrou o processo contra dois simples trabalhadores por terem procurado rebelar o povo de Berlim contra Hitler. Tinham apenas o curso primário: ela empregada doméstica e ele carteiro.
Mas como eles lutaram contra a máquina nazista se sequer armas possuíam? Ambos escreviam cartões postais contra o nazismo, nos quais pediam para as pessoas não cooperarem com o governo nazista, não fazerem doações e não se alistarem ou ajudarem o exército alemão. Na falta das redes sociais de hoje, procuravam tornar visíveis esses pequenos cartões, deixando-os nos bancos de jardins e nas escadas de prédios de apartamentos.
Melhor resistência alemã
O irmão de Elise tinha morrido como soldado na França ocupada e ela e seu marido se rebelavam contra o absurdo dessa guerra que sacrificava jovens e civis nas invasões. No filme, o casal tem os nomes de Otto e Anna Quangel e o gesto de desafio ao nazismo é motivado pela morte do filho soldado, na França ocupada. Quando o livro de Hans Fallada (pseudônimo de Rudolf Ditzen) foi publicado logo após o fim da guerra e pouco antes da morte do autor, o escritor italiano Primo Levi, sobrevivente dos campos de concentração nazistas, considerou-o o melhor livro sobre a resistência alemã ao nazismo.
O diretor do filme, Vincent Pérez, é suíço de Lausanne, filho de pai espanhol com mãe alemã. Este é seu quinto filme. Mais conhecido como ator em numerosos filmes como Rainha Margot, de Patrice Chéreau, e ator preferido de Raoul Ruiz, Pérez viveu com Jacqueline Bisset e Carla Bruni, hoje ex-primeira dama da França. Vincent Pérez apoiou publicamente o chefe indígena Raoni na luta contra a construção da barragem de Belo Monte.
(Rui Martins*/Especial para brpress)
(*) Rui Martins fará a cobertura do 66o. Festival Internacional de Cinema de Berlim , de 10 a 21 de fevereiro de 2016.