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Antonio Bivar: o Punk continua existindo em todos os lugares. Foto: Reformatório/aosquatroventos.weebly.comAntonio Bivar: o Punk continua existindo em todos os lugares. Foto: Reformatório/aosquatroventos.weebly.com

Punk com ‘P’ de paulistano

(São Paulo, brpress) - Autor do seminal O Que É Punk faz um paralelo entre Londres e São Paulo, durante os anos intensos do movimento, que fez 40 anos em 2016. Por Juliana Resende.

(São Paulo, brpress) – Antonio Bivar é um dos poucos intelectuais brasileiros que viveu – e abrasileirou  – o punk, movimento originário da Inglaterra que ganhou o mundo nos anos 70 e fez 40 primaveras em 2016. Autor do seminal O Que É Punk (Editora Brasiliense, 1982, Coleção Primeiros Passos), o diretor teatral, escritor e dramaturgo, de 77 anos, vive agora a maturidade do Punk – assim, com P maiúsculo, como ele mesmo escreve, P de paulistano. 

Bivar foi o organizador do festival O Começo do Fim do Mundo, no Sesc Pompéia, nos anos 80, que marcou o punk de São Paulo. Sim, Bob Cuspe, o caricato punk de Angeli, não nasceu à toa. Foi inspirado numa cena underground pela qual a Paulicéia Desvairada  ainda leva fama. Para Bivar, o punk não morreu – amadureceu. 

Só as ‘preparadas’

“Em 1981, passei o ano em Londres e acompanhei o ressurgimento punk com o ‘PUNK IS NOT DEAD’. As bandas, na maioria não exatamente novas, como Exploited, Discharge, Crass, UK Subs e outras, que não tiveram chance no boom das preparadas, como Sex Pistols, The Clash e outras, puderam desfrutar de certa notoriedade”, conta Bivar, numa entrevista exclusiva à brpress antes de embarcar para (adivinhe)… Londres! 

“Naquele ano, estive presente também em passeatas monumentais contra o desemprego etc, e conto com detalhes essa vivência no livro O Que É Punk”, lembra o escritor. De volta a São Paulo, em 1982 e alfinetado pelo punk, Bivar achou terreno fértil para fazer acontecer o primeiro festival punk brasileiro. O Começo do Fim do Mundo foi realizado nos dias 27 e 28 de novembro de 1982 – o ano mais forte do movimento punk em São Paulo.

O festival reuniu bandas como Cólera, Inocentes, Olho Seco, Ratos de Porão, entre outras, e tinha o objetivo de unir facções punks, da capital e do ABC paulista, que vinham se envolvendo em brigas cada vez mais violentas. Como o Punk.London,  evento multicultural que celebrou os 40 anos do punk em Londres durante todo 2016, o festival de São Paulo  contou com exposição de capas discos, fanzines, filmes e, claro, shows. 

Botinadas

No total, 20 bandas tocaram n’O Começo do Fim do Mundo, e o evento contou com um público de 3 mil pessoas. No primeiro dia, não houve confusão. Mas no segundo dia, teve polícia reprimindo um protesto contra a ditadura militar – que, apesar de agonizante, ainda estava em curso no Brasil. O festival foi histórico e está registrado em CD e vídeos – algumas aparecem no documentário Botinada: A Origem do Punk no Brasil, do ex-VJ da MTV Gastão Moreira, e no filme O Começo do Fim, Enfim, de Camila Miranda, lançado este ano  pelo Selo Sesc e disponível em DVD.

Com a palavra (e sem moicano), Antonio Bivar

Tendo estado em Londres e São Paulo no auge do punk, qual foi sua impressão sobre a tênue fronteira entre o genuíno e o fabricado que sempre permeou o movimento?

Antonio Bivar – Sempre tive uma visão crítica de tudo. Quanto ao Punk, os próprios punks instintivamente sabiam que não seriam notados se não produzissem um visual de acordo – de preferência, que os diferenciassem radicalmente do visual hippie da geração paz & amor anterior. E se não fosse por Malcolm McLaren [empresário dos Sex Pistols], [a estilista] Vivienne Westwood e a loja SEX, no lado pobre da King’s Road, em Londres, nada teria provavelmente acontecido. Malcolm pegou o fantástico material humano pouco mais que adolescente e fabricou os Sex Pistols. Mas os garotos eram genuínos – o que fez o “produto” ter dado certo.

Os 40 anos do punk foram comemorados este ano com o evento Punk.London, que reuniu moda, arte, música, cinema e exposições, em Londres, organizado por instituições, como a prefeitura, que odiavam o punk. É como se a PM celebrasse O Começo do Fim do Mundo. O que acha desse apoderamento do movimento pelo establishment?

AB – Os 40 anos do Punk foram altamente comemorados –– teve até exposição na British Library, atraindo visitantes do mundo inteiro (incluindo eu). Não vejo nenhum mal no fato de o  Sistema ter reconhecido a verdade histórica do movimento. 

Seria a derradeira validação do famigerado “punk de butique”? 

AB – Não podemos jamais nos esquecer de um dos fatores mais impactantes do movimento punk, que foi e continua sendo o visual. Hoje, no visual street fashion tem mais gente com cara de punk do que no começo do movimento, quando SP não tinha mais que 400 punks. Hoje metade da população tem o visual punk, nas cores cítricas dos cabelos, nos piercings, nas tatuagens, nos moicanos nas cabeças dos rapazes, inclusive em jogadores de futebol – Neymar usou e abusou do moicano de salão de beleza. Na Inglaterra, David Beckham já tinha feito isso. Capas de revistas de moda propagam o punk como estilo, o famoso punk de butique.

Qual é o maior legado punk à juventude do século 21?

AB – A atitude contra o Sistema. O Punk tornou-se uma irmandade mundial, universal. É claro que o circuito punk é underground, mas acontece brilhantemente com a internet. 

Num mundo cada vez mais automatizado, previsível e compartimentado ainda há espaço para a atitude-mor do punk DIY (“do it yourself”, faça você mesmo)?

AB – Sem dúvida há espaço e muita gente, não só punks, estão “doing it themselves”. Nas artes, no empreendedorismo, na literatura há gente partindo para esse tipo de ação. Trata-se de uma atitude “autogestiva” – de autogestão. A crise gerada pelos recentes turbilhões e tsunamis políticos, a descrença geral nos políticos, etc, torna a terra fértil para que essa atitude floresça novamente.

Você escreve em O Que É Punk que, no Brasil, o punk teve um viés mais social, e “dos punks eleitores, todos fechavam com o PT (menos um ou dois janistas)”. Era 1982. Acha que ainda hoje, diante dos fatos envolvendo o Partido do Trabalhadores, os punks ainda apoiariam, majoritariamente, Lula e cia? Por quê?

AB – Em 1982 a maioria dos punks paulistanos se acreditavam anarquistas e antipolítica. Alguns fechavam com o PT, mas não todos. Hoje, continuo em contato com muitos punks de São Paulo e do ABC e a maioria DETESTA o PT e os corruptos em geral, sejam de que partido forem. Suas manifestações nas redes sociais, especialmente no Facebook, têm sido ferozes. E acontecem até brigas de punks com os que ainda são pela cesta básica petista. É interessante constatar que, como sempre, são muito bem articulados e firmes em suas posições. O punk paulistano vem basicamente do proletariado e da classe média baixa periférica, além de apaixonados de outras classes (Supla é um exemplo) e me fazem pensar no movimento anarquista paulistano das décadas de 1910/20.

A cena punk paulistana passou batida nos 40 anos do movimento? 

AB – A cena de São Paulo não pode ser comparada ao levante punk como aconteceu em Londres 1976/77, e depois em 80/81. Em 2012, o Sesc Pompeia abriu espaço para a celebração dos 30 anos do festival O Começo do Fim do Mundo e, do evento, foi realizado o documentário O Fim do Mundo, Enfim, que estreou no CineSesc, em fevereiro de 2016, também com o lançamento do DVD, e com a presença maciça de punks de várias gerações.

Há algum plano de reeditar O Que É Punk  (esgotado), por conta do 40o. aniversário, ou mesmo outro livro seu sobre o movimento?

AB – Plano não há de reeditar O Que É Punk, mas já fui consultado recentemente por duas editoras interessadas na reedição. Ainda não tive tempo de tratar do assunto, mas acho que o livro merece reedição por ter sido um dos primeiros no mundo a tratar do tema, e isso graças à Editora Brasiliense, que na época tinha Luís Schwarcz como editor e o sucesso da coleção Primeiros Passos, da qual o livro fez parte.

Acha que podemos esperar algum tipo de levante punk à sombra do Brexit?

AB – Acredito que ainda possa acontecer algum levante punk na Inglaterra. O Punk continua existindo em todos os lugares – inclusive em São Paulo. 

(Juliana Resende/brpress)

Juliana Resende

Jornalista, sócia e CCO da brpress, Juliana Resende assina conteúdos para veículos no Brasil e exterior, e atua como produtora. É autora do livro-reportagem Operação Rio – Relatos de Uma Guerra Brasileira e coprodutora do documentário Agora Eu Quero Gritar.

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