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“Regular a internet é um passo para trás”“Regular a internet é um passo para trás”

“A internet não existe”

(brpress) – É o que diz Jaron Lanier a Gabriel Bonis, numa conversa sobre tecnologia na sociedade pós-moderna com o cientista, escritor, músico e artista que inventou o termo “realidade virtual”.

(brpress) – Aos 50 anos, o americano Jaron Lanier pode se considerar um homem de muitos talentos, afinal é cientista da computação, artista visual e autor do livro Gadget – Você Não é Um Aplicativo (Editora Saraiva, 248 págs., R$ 39,90), recém-lançado no Brasil. Eleito, em 2010, pela revista Time como uma das 100 pessoas mais influentes do planeta, foi um dos pioneiros do Vale do Silício e precursor na venda de equipamentos que permitiam o acesso à “realidade virtual” – expressão criada por ele mesmo.

    Além de tudo isso, Lanier tem uma carreira musical não apenas nas horas vagas. Assina, inclusive, a co-composição da trilha do documentário The Third Wave (2009). A brpress conversou com o multifacetado autor sobre os avanços e a dependência da sociedade pós-moderna em relação à tecnologia.

    Confira a entrevista exclusiva, concedida por e-mail:

Vivemos uma época na qual pessoas e empresas utilizam e dependem, consideravelmente, da internet para se comunicar ou realizar atividades rotineiras. Certamente, essa ferramenta possibilitou muitos avanços na maneira de nos comunicarmos, mas nossa dependência da internet aumenta cada vez mais. Você acredita que isto pode ser prejudicial? Por quê?

Jaron Lanier – Não existe remédio que não seja também potencialmente venenoso, ou uma ferramenta que não seja potencialmente uma arma. Não faz sentido, talvez, que as pessoas tenham de aprender como usar bem cada nova tecnologia para permanecer em uma boa posição, mas é o preço que pagamos para aproveitar os benefícios reais da tecnologia. No caso da internet, há diversas formas de má utilização, mas as piores geralmente têm algo em comum, que é um modelo no qual as pessoas começam a se imaginar um pouco como computadores ao invés de humanos. Este problema pode não ser óbvio e, por isso, foi importante escrever o livro Gadget – Você Não é Um Aplicativo.

    Os lançamentos tecnológicos ocorrem cada vez mais rapidamente, o que gera uma vasta gama de produtos despertando desejo e ansiedade de compra – os adorados gadgets. Você acredita que essas constantes transformações influenciam na construção cultural das sociedades pós-modernas, devido às imensas funcionalidades que vão sendo acrescentadas para facilitar a comunicação? De que maneira isso influencia na maneira como nos relacionamos socialmente e como você enxerga a abrangência deste “fenômeno” de comportamento?

JL – É uma situação bem estranha. Uma pequena comunidade de jovens bem dotados tecnicamente, na maioria homens, e em grande parte casos centrados no Vale do Silício, na Califórnia, e outros locais como Índia e China, estão se tornando os condutores dos modelos internacionais de comportamento em família, namoro e qualquer outros assuntos íntimos. Essa população de jovens líderes, em particular, tende a ter habilidades sociais pobres, são os “nerds”, frequentemente com um toque de Síndrome de Asperger [transtorno psiquiátrico que afeta a área do relacionamento interpessoal e comunicação, embora a fala seja relativamente normal]. Então é uma situação em que o antissocial e o estranho estão estabelecendo as regras da sociedade. Seria como ter pessoas que não podem sentir cheiros ou gosto se tornando chefes de cozinha.

O surgimento de redes sociais Facebook e Twitter e sites de informação compartilhada como Wikipédia tem alcançado grande abrangência no mundo virtual, se tornando plataformas de comunicação instantânea e aprendizado. Você acredita que estas ferramentas são mais instrutivas ou prejudiciais no que diz respeito à qualidade da informação?

JL – Essa é uma pergunta complicada. Existem casos em que essas ferramentas são bem sucedidas e, certamente, existem diversas pessoas que têm boas experiências com elas. E há também sérios problemas, que são descritos no meu livro. No caso do Wikipédia existe uma inevitável, estrutural, mas errada, ideia de que possa sempre existir uma maneira correta de descrever um assunto. Isso, frequentemente, não é verdadeiro e sempre faz os assuntos ficarem cansativos.  

Qual o verdadeiro peso das redes sociais em exercer pressão, protestar, criar movimentos, propagar idéias de forma autônoma e, de fato, provocar alguma mudança no âmbito do mundo real?

JL – Se a questão é sobre transformar o mundo, é verdade que têm havido exemplos de Twitter e Facebook ajudando em certas situações. Existe uma tendência de que estas ferramentas ofereçam maior impulso aos menores e mais independentes movimentos políticos.

Uma das características mais fortes da internet é a liberdade. É possível compartilhar arquivos, ter acesso e produzir informação sem censura, entre outras coisas. Você acredita que a internet é um universo sem leis? Você defende a criação de uma espécie de regulamentação para internet? Como seria?
 
JL – Essa é a continuação da eterna batalha de dilemas da condição humana. Liberdade por si só acaba não sendo boa o bastante, porque as pessoas precisam ser protegidas das “baixezas” dos outros. Porque é difícil coordenar esforços quando há muitas pessoas indispostas a se comprometerem pelos outros. Então, terminamos com leis e estruturas sociais.

E a questão dos direitos autorais?

JL – Em relação a compartilhamento de arquivos, pergunta correta a se fazer não é “O que me é permitido fazer na internet?”, e sim “Que benefício eu quero da internet?”. Se você quer ser capaz de ganhar a vida com sua mente e coração online, então, só será capaz de conseguir isso em um mundo no qual cada indivíduo pague ao outro pelo que fazem com seus corações e mentes online. É simples assim. Não é diferente da situação no mundo físico. Se você quer viver em um mundo no qual não precisa se preocupar em ser atacado na rua, você tem de decidir que, para você, não é correto atacar alguém na rua. Essa é a famosa Regra de Ouro. Liberdades e vantagens estão interligadas. Todos nós ocasionalmente desejamos escapar dessa realidade e ser livres sem custos, mas isso é apenas uma fantasia.

A criação de uma espécie de legislação reguladora não eliminaria um dos pontos que torna essa ferramenta mais atraente? Quais os problemas comuns que a liberdade excessiva pode causar neste ambiente?  

JL – A melhor regulamentação é o bom senso e a criação de uma cultura de respeito. Espero que o livro Gadget – Você Não é Um Aplicativo desempenhe um pequeno papel na criação desta sensibilidade cultural, que possa ser acentuada pelas ações de um governo responsável. Mas, “regular” a internet é um passo para trás. A internet não existe. É só um monte de pessoas que, espero, venham a querer um pouco mais de autoridade para as razões corretas.
 
(Gabriel Bonis/Especial brpress)

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