Chique é ser ético
(São Paulo, brpress) - Começa, ainda que tímida, no Brasil, toda uma movimentação em torno da moda sustentável, já difundida na Europa.
(São Paulo, brpress) – Começa, ainda que tímida, no Brasil, uma movimentação em torno da moda sustentável. Isso significa consumo consciente, mais patrulha ética – vide o estardalhaço nas redes sociais relativo às péssimas condições de trabalho de imigrantes na produção de peças para a Zara no Brasil – e mais oportunidade e valorização de negócios que tenham como objetivo oferecer um produto com uma função social além do lucro. Um produto que agrega satisfação, identificação e admiração de quem compra.
Apesar de o consumo eticamente correto ir na contramão do “ethos” da indústria da moda – comprar não porque precisa, mas porque é a peça da estação –, o chamado mercado fast fashion – redes de moda jovem, barata e descartável, em que reina a gigante H&M– está transformando a culpa no cartório por denúncias de exploração de mão-de-obra e do meio-ambiente sem qualquer contra partida em um ativo sustentável, apoiando campanhas ‘fair trade’ (comércio justo) e dando voz e, não raro, mídia em suas próprias roupas, logos e etiquetas a causas sociais, ambientais e econômicas.
Em fevereiro de 2012, empresários e profissionais da indústria da moda brasileira conheceram matérias-primas inovadoras em tecnologia e design (couros, materiais sintéticos, pedrarias, fitas, botões, solados, cabedais, cordões, entre outros componentes) durante o 5o. Salão Inspiramais. Projetos que unem tecnologia e sustentabilidade, como o Mix By Brasil, da estilista Chiara Gadaleta, atraíram a atenção dos estrangeiros.
Um comprado, um doado
Os irmãos Maxime e Alexandre Mussard, herdeiros da grife francesa Hermès e compradores da marca italiana Twins for Peace, estiveram no Inspiramais e declararam que pretendem terceirizar uma fábrica no Brasil até o final do ano, utilizando matéria prima nacional. A primeira loja brasileira será inaugurada também em 2012, no Shopping Cidade Jardim, em São Paulo.
A Twins for Peace fabrica tênis artesanalmente utilizando 90% de matéria-prima reciclada, além de aliar responsabilidade social e moda com projetos ao redor do mundo. A sua missão é criar um produto simples e elegante e, ao mesmo tempo, socialmente responsável. Por isso, quando se compra um par de tênis, outro é doado para uma instituição regulamentada pela Unicef. Essa ação faz parte do Shoe Project da Twins for Peace.
Fundada em 2009 pelos gêmeos Maxime e Alexandre Mussard, a marca doou, em 2009, centenas de pares de sapatos para as crianças da favela São Remo, em São Paulo. Segundo os sócios, o impacto deste projeto, que ocorreu através da ONG Alavanca, foi tão grande que serviu de inspiração para muitos outros, a exemplo do projeto Moçambique 2010, onde sapatos foram doados para orfanatos.
O ex-jogador de futebol Raí foi escolhido pela empresa para ser o embaixador e garoto propaganda da marca no Brasil. Parte da renda obtida com a venda de cada par no país será revertida para a Fundação Gol de Letra, que capacita jovens em situação social de risco, da qual o atleta é diretor.
Luxo
Palha de milho, jornal, plástico reciclado e técnicas artesanais como tear manual, tingimento natural, crochet e macramê são o charme e o cada vez mais valioso selo de sustentabilidade a produtos do Mix By Brasil. “É preciso calcular o capital natural (recursos, matéria prima, natureza) e o capital humano (mão de obra, trabalho e disposição humana). Esse tipo de produto custa mais caro, porque é preciso levar em consideração a ética, o bem estar e o fator ecológico. É um novo conceito de moda artesanal, mas que equivale ao mercado de luxo. É um projeto a longo prazo que precisa ser desenvolvido no Brasil”.
Marcas famosas brasileiras como de tecelagem e outras, como Flávia Aranha, Osklen e Maria Bonita, trabalham com a questão da sustentabilidade. Com o projeto Mix by Brasil, muitas cidades foram percorridas e comunidades e instituições foram estudadas por desenvolverem um trabalho excepcional, envolvendo questões sustentáveis. “Toda grande empresa, em um futuro breve, será obrigada a desenvolver e a pensar na sustentabilidade da moda”, relata Chiara.
O Mix by Brasil está em fase inicial, em que se visa estabelecer uma relação definitiva entre a moda e a sustentabilidade, mas a estilista já mostrou que trabalhar com a sustentabilidade modal e focar na economia criativa no Brasil é totalmente possível e viável. Participaram dessa fase inicial do Mix by Brasil: Palhas Fashion (Birigui-SP), Art D`Mio (Bras Pires-MG), Pólo Veredas (Arinos-MG), ONG Florescer (São Paulo-SP), Instituto Bantu (Recife-PE) e ONG Aldeia do Futuro (São Paulo-SP).
Eco-lingerie
No Reino Unido, a valorização da moda sustentável só cresce – afinal, consumir conscientemente, além de contribuir para um mundo mais justo e equilibrado, dá status. Geralmente, os produtos são mais caros, como ressaltou Chiara Gadaleta, e sinônimo de exclusividade. É o caso das eco-lingeries da estilista Charini Suriyage, a primeira nativa do Sri Lanka a participar da London Fashion Week, a semana de moda de Londres.
Utilizando somente materiais artesanais – e nada de elásticos, metais, plásticos ou qualquer coisa que incomode –, Charini faz calcinhas e sutiãs que colocam grifes como La Perla e Victoria’s Secret no chinelo – ou melhor, no bojo de arame daquele opressivo “porta-seios”. A estilista usa somente mão de obra e materiais vindos de seu país e por isso, e pelo produto inovador, venceu o Ethical Fashion Designer Award, no Sri Lanka Design Festival de 2010.
Na London Fashion Week muito se falou e se divulgou sobre moda sustentável. E não só em campanhas e atitudes diretas, como escolher fornecedores e matérias-primas de forma mais ética, mas abraçando causas que transcendem a fabricação e o consumo de roupas. A icônica estilista inglesa Vivienne Westwood usou seu desfile para divulgar a campanha CoolEarth (www.coolearth.org). Trata-se de uma mobilização sem precedentes para salvar a Floresta Amazônica da desvatação em 10 anos. Westwood também lançou uma linha de bolsas africanas, a Ethical Fashion Africa Collection, parceria dela com a International Trade Centre, uma das agências da ONU, que tem como objetivo principal a geração empregos pra população de Nairóbi, a capital do Quênia.
Algodão
Em 30 de março, a Environmental Justice Foundation (EJE) lança sua nova coleção de camisetas produzidas e estampadas dentro dos mais estritos padrões éticos (com certificação da Earth Positive), fabricadas na Índia com energia solar e eólica, para celebrar, com muito estilo, seus dez anos de atividades envolvendo moda e ativismo. Com o slogan Pick Your Cotton Carefully (“escolha seu algodão cuidadosamente”), a EJE procura alertar sobre assuntos pesados como as condições dos produtores de algodão, trabalho infantil e maus tratos ao meio-ambiente na maioria das lavouras e fábricas têxteis de países em desenvolvimento.
Com estampas enfocando temas como os benefícios da produção orgânica, os malefícios dos pesticidas, comércio justo e denunciando abusos dos direitos humanos, as camisetas serão vendidas no site www.ejfoundation.org a £30 cada (cerca de R$ 81,00). Com essa mistura de temas explosivos, talentos emergentes e consagrados, como Christian Lacroix, além de celebridades vestindo as camisetas, como a cantora Joss Stone, a EJE espera receber mais recursos (todo o lucro com as vendas são reinvestidos em outras campanhas) e ajudar o consumidor a ter mais consciência da importância de suas escolhas e o que há por trás de marcas e do conceito fashion.
Porque chique é ser ético e fazer a sua parte nesta revolução criativa.
(Juliana Resende/brpress)