Nanini, dinossáurico
(Sâo Paulo, brpress) - Ator prova grandeza e versatilidade vivendo pai perdedor e filha histérica em Pterodátilos, que teve temporada prorrogada. Por Lucianno Maza.
Sâo Paulo, brpress) – Com a sinopse de Pterodátilos, que teve temporada paulistana prorrogada, no Teatro Faap, seria fácil imaginar um drama na linha dos conflitos familiares. Mas o autor norte-americano Nicky Silver faz do texto uma comédia ácida em ritmo alucinante, que critica de forma aguda as convenções sociais e valores morais como a família, a sexualidade e o relacionamento amoroso.
Silver constrói uma fábula tão surreal quanto pungente, que comunga a melancolia nervosa ao absurdo risível. O texto estreou em 1993, na Broadway, e recebe agora a tradução de Erica Migon e Ursula Migon.A mãe é alcóolatra e já não sabe mais se está às voltas com os preparativos do casamento ou funeral de sua filha. O pai, um perdedor clássico que tenta parecer estar no controle, confunde momentos de sua infância com os vividos pelos filhos. A filha é uma jovem perturbada, bipolar, ansiosa e depressiva. Seu noivo, de sexualidade confusa, é transformado em empregada doméstica da família.
É para este núcleo decadente que retorna o outro filho do casal, autodestrutivo. Com o propósito de escavar embaixo da casa atrás de ossos de dinossauros, o filho pródigo acaba revelando que são eles mesmos, os disfuncionais integrantes daquela família, que estão soterrados há muito tempo. A humanidade, enfim, extinta.
Reencontro
Felipe Hirsch já havia dirigido o mesmo texto na encenação dupla Os Solitários que, além deste, trazia outro assinado por Silver: Homens Gordos de Saia. Se naquela montagem de 2002 – que trazia Marieta Severo e um pouco conhecido Wagner Moura –, existia uma grandiosidade que afetava, em certa medida, a percepção da obra, agora o diretor aposta mais na relação dos atores com o texto, em uma encenação enxuta e bem resolvida.
O grande achado da proposta de Hirsch para o espetáculo, tanto na primeira versão como nesta, é a inciativa de colocar um mesmo ator, homem e mais velho, para representar além do pai da família, a jovem filha vivida por Marco Nanini – de longe a melhor personagem. A graça é rápida com a imagem do homem vestido de menina, mas não se sustentaria sem o talento de um grande intérprete.
Pai e filha
Marco Nanini é novamente o responsável por dar vida aos extremos: é o velho, apático e desinteressante pai, e também a infantil, histérica e simpática filha, em composições precisas. Especialmente como a garota, o ator arranca gargalhadas volumosas e aplausos entusiasmados, e não é para menos: seu desempenho é mesmo memorável.
É a mãe
Parceira à altura, Mariana Lima prova que é uma das grandes atrizes de sua geração, exibindo uma interpretação deliciosamente divertida para a mãe ensandecida. A atriz, que estamos acostumados a admirar em interpretações delicadas em montagens metateatrais, apresenta um trabalho ultraexteriorizado, exagerado, conseguindo manter o tom gritado e o estado levemente ébrio ao longo de toda sua interpretação.
Noivo e irmão
O jovem Felipe Abib não estreou profissionalmente há muito tempo, mas já tem em seu currículo uma interessante galeria de espetáculos pelos quais passou, dos mais variados gêneros e estruturas. Aqui, mais discreto, ele reincide num bom trabalho. Quanto a Alamo Facó, o irmão, a caracterização clichê dificulta um pouco a dimensão de seu personagem para além do clichê, mas o ator tem bons momentos quando aposta numa mistura de apelo sexual e violência.
Cenário e luz
Daniela Thomas, como de costume, traz soluções para o cenário que interferem definitivamente na cena: desta vez, a sala sobre um mecanismo hidráulico faz com que o piso se movimente em inclinações e as tábuas soltas revelem buracos dificultando consideravelmente o andar dos atores, numa proposta representativa.
A iluminação fria e chapada de Beto Bruel é um bom recurso para a cena e os figurinos de Antonio Guedes são corretos.
Sessões: sexta, às 21h30; sábado, às 21h; e domingo, às 18h. Até 21 de agosto.
Ingressos: R$ 60,00 e R$ 80,00.
(Lucianno Maza, do Caderno Teatral / Especial para brpress)