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Rio Nanay, afluente do rio Amazonas, que fornece água potável para 500 mil habitantes. Foto: Marcos ColónRio Nanay, um afluente do rio Amazonas, que fornece água potável para 500 mil habitantes na Amazônia. Foto: Marcos Colón

Pisando suavemente na Amazônia

Documentário Pisar Suavemente na Terra entrelaça depoimentos de três lideranças amazônicas, ecoando grito de urgência. Por Geraldo Cantarino.

(brpress*) – Há filmes que simplesmente passam. Outros permanecem com a gente. Assim é com o documentário Pisar Suavemente na Terra, exibido na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e no Filmambiente, por tratar da Amazônia, antes de entrar em circuito comercial.

O filme traz o relato pungente de três lideranças indígenas da Amazônia, duas no Brasil e uma no Peru. São histórias de enfrentamento, resistência e sobrevivência. Registros de uma guerra secular em defesa de seus espaços e tradições em harmonia com a natureza. Uma natureza sistematicamente ameaçada, violada e aviltada por uma cultura predatória em nome do desenvolvimento.

No momento em que se verifica o desmonte da política ambiental promovido pelo governo de Jair Bolsonaro – que facilitou o garimpo ilegal, a mineração e o desmatamento recorde em áreas protegidas –, o documentário é um emocionante grito de urgência que ecoa em nossa consciência.

Lideranças amazônicas

O documentário entrelaça depoimentos de três lideranças amazônicas.

Tônkyré Akrãtikatêjê (Katia Silene Valdenilson), primeira líder feminina da etnia Gavião Akrãtikatêjê, reconta o deslocamento forçado de seu povo durante a ditadura militar em função da construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará. Ela e os Akrãtikatêjê moram, hoje, na Terra Indígena Mãe Maria, próximo de Marabá (PA), para onde foram levados compulsoriamente.

“O mundo do branco é diferente do nosso mundo. Hoje, querendo ou não, nós temos que socializar. Nós temos que aprender para enfrentar esse mundo, que nada nos favorece. Não somos incluídos nos planejamentos do Estado, do governo. Mas o próprio governo, o Estado, estava por trás quando destruiu a nossa terra, destruiu a nossa aldeia. Não pensou em nós. Nunca vai pensar”, afirma Tônkyré Akrãtikatêjê.

Tônkyré Akrãtikatêjê (Katia Silene Valdenilson), primeira líder feminina da etnia Gavião Akrãtikatêjê.

O cacique Manoel Munduruku, liderança indígena da Aldeia Ipaupixuna e coordenador do Conselho Munduruku do Planalto, representa quatro aldeias do povo Munduruku e um território do povo Apiaká.

Indústria na aldeia

Sua base é Santarém (PA), onde está localizado o Terminal da Cargill, multinacional de produção e processamento de alimentos e maior exportadora de soja e milho do Brasil. 

Munduruku conta que o terminal foi construído onde antes era uma aldeia indígena da Amazônia. “Para nós é uma situação complexa. Porque a gente lutou tanto contra esse grande empreendimento e hoje está aqui instalado”, lastima.

A Cargil está agora com projeto de construção de um novo porto de embarque e desembarque de soja dentro do Lago do Maicá, um santuário ecológico, berçário natural de diversas espécies da Amazônia, na beira do rio Amazonas. “Vai ser outra destruição, vai ser outra poluição”, prevê Munduruku. 

O diretor e produtor de Pisar Suavemente na Terra, Marcos Colón, já fez outra conexão entre destruição da natureza e industrialização, quando dirigiu e produziu o documenta Beyond Fordlândia (2018), um relato ambiental da aventura do empresário norte-americano Henry Ford na Amazônia.

Rio Nanay X mineração

José ‘Pepe’ Manuyama, também conhecido como o Homem da Água, é professor de origem indígena Kukama. Ele faz parte do Comitê em Defesa da Água, da cidade de Iquitos, no Peru. Junto a milhares de cidadãos, participa da defesa do rio Nanay, um afluente do rio Amazonas, que fornece água potável para 500 mil habitantes.

“Este rio nos dá alimentação, porque daqui se tiram muitos peixes. Este rio nos dá praias lindas, de areia branca. Este rio nos dá um ecossistema maravilhoso”, relata Manuyama ao tocar, carinhosamente, a superfície da água com a ponta dos dedos. No entanto, as águas escuras do Nanay estão sendo poluídas por atividades de mineração.

“Este lindo rio, extraordinário, tão bondoso em riquezas, está sendo contaminado por dragas que estão despejando mercúrio, um dos metais mais tóxicos, (…) contaminando as águas, contaminando os peixes”, continua. Um crime ambiental que coloca em risco a saúde de meio milhão de pessoas. 

“Este rio nos dá alimentação, porque daqui se tiram muitos peixes”, diz José ‘Pepe’ Manuyama.
A sabedoria de Krenak

Permeando os depoimentos, estão as falas de Ailton Krenak, uma das maiores lideranças do movimento indígena brasileiro. Ambientalista, filósofo e professor da etnia Krenak, ele é autor de livros como Ideias para Adiar o Fim do Mundo (Cia das Letras). Com sua dança das palavras, Krenak emprega ao filme uma voltagem ética e poética. Inspira reflexão. Transborda sabedoria.

“O futuro é ancestral. Ele é tudo que já existiu. Ele não é o que está lá em algum lugar. Ele é o que está aqui. Ele é presença. Porque a vida só está em mim agora. Depois ela não vai estar mais aqui. É preciso perseverar num modo de estar no mundo que é pisar suavemente na terra”, sugere, emprestando ao documentário seu título.

Krenak nos convida a sonhar com uma realidade alternativa, em que pessoas educadas pela floresta desejam um outro mundo, um mundo que produz possibilidade de afeto entre humanos e não humanos.

“A gente não veio ao mundo para comer o mundo. A gente veio para dançar a vida. (…) A gente tem que aprender com a terra. Aprender a escutar a terra. Aprender a lição da terra”, sugere Ailton Krenak. 

Pisar Suavemente na Terra é um filme potente. Tomara possa mudar o mundo. 

Geraldo Cantarino, especial para brpress 

Assista ao trailer do documentário Pisar Suavemente na Terra: 

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Geraldo Cantarino

Geraldo Cantarino é jornalista, formado pela Universidade Federal Fluminense e com Mestrado em Documentário para Televisão pelo Goldsmiths College, Universidade de Londres. É autor de quatro livros publicados pela Mauad Editora.

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