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José Padilha rebateu a críticas de Dilma Rousseff sobre O Mecanismo. Foto: Alexandre Loureiro/NetflixJosé Padilha rebateu a críticas de Dilma Rousseff sobre O Mecanismo. Foto: Alexandre Loureiro/Netflix

‘A corrupção não tem ideologia’, diz José Padilha

(brpress) - Diretor rebate críticas e diz que série O Mecanismo mostra corrupção como “uma lógica estruturante da política brasileira”. Por Juliana Resende.

(brpress) – A estreia da série sobre a corrupção endêmica na política brasileira O Mecanismo (Netflix), em 23/03, em 190 países – Brasil obviamente incluído –, na semana do julgamento do último recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já condenado, não poderia ser mais adequada. A série, baseada na Operação Lava Jato e dirigida por José Padilha (Tropa de Elite e Narcos), mostra como os governos do PT abraçaram sem escrúpulos uma prática que sempre existiu no país: o financiamento da troca de favores entre políticos e gestores com dinheiro público.

O Mecanismo começa com um resumo preciso do estado das coisas no Brasil: “O que f*de nosso país não é a violência nas favelas, não é a falta de educação, não é o sistema de saúde falido, o déficit público nem a alta taxa de juros. O que f*de nosso país é a causa de tudo isso”, diz o policial federal Marco Rufo, vivido pelo ator Selton Mello, e inspirado num delegado na vida real. “Mas como tudo na série, não se trata de uma reprodução fiel do noticiário. O Zé [Padilha] e a Elena Soárez [roteirista] criaram um thriller, uma obra de ficção baseada em fatos reais”, ressalta Mello. 

Cidadão instigado

“Rufo é um cidadão instigado, um cara que não aguenta mais esse estado das coisas no Brasil – nós”, define o ator. “E ele quer lutar, quase que quixotescamente, mas O Mecanismo [ou seja, a corrupção endêmica] não deixa. Ele é tratado como louco e somente a Verena, uma outra policial [Caroline Abras], que acaba seguindo em frente obstinada em prender os corruptos, o entende”. Por ser a dramatização de algo que não acabou, Mello acha que podem vir aí “umas 30 temporadas” e que “falar do que está acontecendo é ótimo – Padilha é corajoso e um dos caras mais inteligentes que conheço”. 

Quando Selton Mello concedeu esta entrevista, as críticas a O Mecanismo ainda não haviam invadido as redes sociais, especialmente de petistas ofendidos com os inevitáveis nomes aos bois (embora sejam trocados na ficção) – leiam-se doleiros, operadores, diretores de estatais e presidentes da república. Ora, Janete é claramente a ex-presidente Dilma Rousseff, que disse em uma entrevista usar esse nome falso em ligações de telemarketing, numa referência a seus anos como guerrilheira na clandestinidade. Dilma criticou a série: “O diretor inventa fatos. Não reproduz ‘fake news’. Ele próprio tornou-se um criador de notícias falsas”, afirma sobre Padilha. 

‘Boboca’

O diretor lembrou, em entrevista coletiva em São Paulo sobre o filme 7 Dias em Entebbe (longa mostra sequestro de avião que marcou o conflito israelo-palestino nos anos 70), que está preparado para críticas. “Fiz Tropa de Elite 1”, brinca, numa referência a um dos maiores sucessos de bilheteria do cinema nacional, vencedor do Urso de Ouro, o maior prêmio do Festival de Berlim.

Padilha definiu como “boboca” a reclamação de Dilma, cuja tônica foi a frase “estancar a sangria”, dita na verdade pelo senador Romero Jucá ao delator Sérgio Machado, no sentido de que algo precisava ser feito para impedir as investigações da Lava-Jato, ter sido atribuída na série ao personagem equivalente a Lula. 

“Chequei os diálogos. São diferentes. Não houve transcrição por parte da Elena”, rebateu José Padilha ao chororô de Dilma e lulo-petistas, que ameaçaram cancelar suas assinaturas da Netflix. Selton reafirma que admira a habilidade de Elena Soárez de fugir da mera transcrição dos fatos, criando emendas ficcionais necessárias para que a trama faça sentido em outros países que não só o Brasil. “A Lava Jato é complexa”, admite o ator, assim como o fato de a série tê-lo feito se interessar por política – coisa que nunca havia acontecido antes.  

Sem ideologia

A corrupção não é um privilégio brasileiro. E não estou preocupado com a polarização, especialmente no Brasil, mas com a reflexão”, argumenta Selton Mello. “Estamos fazendo um corte histórico, como fez o filme A Lei É Para Todos e o livro Lava Jato, de Vladimir Netto, em que a série também foi baseada, bem como muitas obras que já existem ou virão a existir sobre o maior escândalo de corrupção da história do Brasil.”

Padilha afirma que fato de o Jucá ter usado a expressão “estancar a sangria” [no sentido de impedir a continuidade da Lava Jato], colocada na boca do personagem que seria equivalente a Lula na série, não a interdita: “Escritores continuam livres para fazer uso dela”. E responde com certa ironia sobre o fato de os petistas terem se incomodado apenas com frases – questões bem menores que os rios de dinheiro desviados descobertos pela Lava Jato.  

O diretor continua: “Minha tese e a tese intrínseca apresentada neste show é: ‘A corrupção é uma lógica estruturante da política brasileira nas cidades, nos estados e no âmbito federal desde o governo Sarney até hoje. A corrupção não tem ideologia – é de direita e de esquerda –, assim como não tem partido – está no MDB, PT, PSDB e outras siglas. É com grande estarrecimento que vejo as pessoas defendendo um lado e outro, se recusando a admitir o óbvio: O Mecanismo tornou-se a engrenagem generalizada no Brasil”. 

(Juliana Resende/brpress)

Leia mais sobre José Padilha 

Padilha. Assista ao trailer 2 de O Mecanismo:

Juliana Resende

Jornalista, sócia e CCO da brpress, Juliana Resende assina conteúdos para veículos no Brasil e exterior, e atua como produtora. É autora do livro-reportagem Operação Rio – Relatos de Uma Guerra Brasileira e coprodutora do documentário Agora Eu Quero Gritar.

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